Órgão se consolidou como prestador de serviços com o maior número de reclamações por parte da população
Matéria de Eduardo Costa
O Departamento Estadual de Trânsito do Piauí (Detran-PI) se tornou um problema na vida de quem precisa utilizar algum serviço do órgão. Transtornos são relatados quase que diariamente nos meios de comunicação, como é o caso da estudante Isabel Vieira, que não consegue agendar o seu teste prático para conseguir a primeira habilitação.
“Eu agora estou tendo dificuldade para marcar meu teste de moto. Já tem um mês que a autoescola diz que não tem vaga. Já tinha acontecido comigo no teste de carro, passei três meses esperando. Passei até a desconfiar, achando que era a autoescola que não queria marcar meu teste, mas eles me provaram que não. Quando o problema não era falta de vaga, era queda do sistema. Fui até ao Detran, mas não resolveram meu caso e voltei para casa estressada”, disse a estudante.
Essa reportagem procurou empresários proprietários de autoescolas, para saber como está sendo a relação com o Detran no que corresponde ao setor de Habilitação. Nenhum dos proprietários procurados quis falar por alegarem sofrerem perseguição caso critiquem o órgão.
Outro problema relatado é o da empregada doméstica Conceição Dias. Ela está tentando fazer o primeiro emplacamento da sua moto há uma semana, mas ainda não conseguiu resolver a demanda.
“Estou tentando fazer o emplacamento da minha moto e já fui até a sede do Detran três vezes e até agora não consegui resolver o meu problema, sendo que eu já fiz a vistoria da moto e quando entro no site, não consigo emitir as taxas que tenho que pagar e assim minha situação fica muito difícil, porque presencialmente também não consigo resolver”, contou.
Além de causar problemas a usuários, o sistema de tecnologia utilizado pelo Detran tem causado também prejuízos. Serviços como venda de carros, transferência, entre outros, estão demorando muito para serem realizados. Queixas como essa são diariamente relatadas através de veículos de comunicação e pelas redes sociais.
O advogado Heitor Bezerra conta sobre dificuldade enfrentada para emitir o licenciamento anual do seu carro e a frustração que passou por depender do sistema do Detran.
“Nesse último ano tive um grande problema com o Detran. Eu paguei todas as taxas de licenciamento do meu veículo e mesmo assim, três meses depois, ainda não consegui emitir o meu licenciamento anual porque segundo aparecia no sistema, eu tinha uma multa em outro órgão. Eu encontrei a multa, paguei e mesmo assim, dois meses depois, ainda não foi liberado o meu licenciamento. Tentei resolver o problema presencialmente no Detran e chegando lá, por mais de três vezes, disseram que o sistema estava fora do ar e que eu deveria esperar. Com isso, tive que vender meu carro abaixo do preço por não ter o certificado anual apesar de ter pago”, disse o advogado.
Outro ponto de reclamação da população são os aumentos das taxas dos exames médico, psicotécnico e emissão de CNH em 2022. O exame médico teve um aumento de 53.84%, saindo de 65 reais para custar 100. O exame psicotécnico teve um aumento de 60%, saindo de 75 reais e passando a custar 120. E a emissão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), saiu de 276 e agora, custando 306 reais, com aumento de 10.86%.
O Economista e professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), João Victor Sousa, explica a justificativa do Detran para efetivar o aumento das taxas.
“O argumento do Detran é de que não havia um reajuste nos últimos 10 anos. Então esse aumento representa uma compensação pela alta acumulada de 77% da inflação nos últimos 10 anos, além do reajuste dos conselhos de psicologia e medicina, que interferem na taxa cobrada pelos exames exigidos para tirar a CNH. O que acontece é que apesar de ser uma alta acumulada nos últimos 10 anos, ela foi reajustada de forma instantânea, ela vai ser muito mais sentida pela população. O Detran transferiu a responsabilidade do aumento para os conselhos já citados e também para a Secretaria de Administração e Previdência do Estado, que segundo o Detran, é responsável por definir o valor das taxas”, destacou o economista.
De acordo com o levantamento realizado em 2021 pelo Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI), em 2019, o Detran arrecadou acima dos R$ 168 milhões; em 2020 acima dos R$ 140 milhões e em 2021, acima de R$ 40 milhões. Essa queda de arrecadação é justificada devido ao contexto da pandemia.
A arrecadação de valores do Detran compreende, via de regra, as multas de trânsito, as taxas pela prestação de serviços, alienação de bens móveis e outras receitas arrecadadas. O relatório também aponta que a arrecadação do Detran supera a sua despesa paga. Segundo o levantamento, a despesa paga pelo departamento representou 42% de tudo que foi arrecadado pelo órgão.
O Economista João Victor Sousa classifica o aumento das taxas como inadequado devido ao momento econômico do País.
“Apesar de a inflação ter encarecido o nível geral de preço e isso não ter sido compensado pela taxa do Detran nos últimos 10 anos, há um empobrecimento da população e a perda de renda é um fator que deve ser considerado para impedir que esse aumento se desse de maneira tão significativa, principalmente num contexto de crise. O mais recomendável seria que esse aumento acontecesse de maneira gradual nos próximos anos, acompanhando uma possível recuperação da economia brasileira. Apesar de justificar essa compensação, o reajuste se torna inadequado pelas condições econômicas do povo piauiense”, apontou.
Mesmo sendo um dos órgãos públicos que mais arrecada no estado do Piauí, o Detran se consolidou, nos últimos anos, como órgão com o maior número de reclamações sobre a prestação de serviços. O levantamento realizado pelo TCE-PI apontou diversos problemas na gestão de recursos e na qualidade de serviços prestados pelo Detran-PI.
Conforme o documento, alguns problemas encontrados foram:
Buscamos um posicionamento do Detran Piauí através da sua assessoria de comunicação, mas não obtivemos resposta.